sábado, 25 de dezembro de 2010

Mas você foi embora

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Fiquei largada com as pernas nuas dentro daquele ônibus lerdo. Pensando se eu estivesse mais um tequinho que fosse bêbada, uma gota a mais, eu teria saltado e te obrigado a me carregar pra cima. Por que eu fiquei com aqueles teus olhos que estavam me olhando daquele jeito que eu morro - junto com aquele sorriso que acompanha, aquele sorriso, meu deus, e eu indo pontos e pontos pra frente pensando que agora já era. Cheguei em casa e tentei continuar a vida, li uns livros (como eu pude ficar tanto tempo deixando eles pra trás pra só escutar música?) - às vezes os livros fodem a nossa cabeça, determinados livros, e você precisa de um tempo pra respirar, eles viram cargas muito pesadas por justamente te jogarem na cara que você não está vivendo, ou está vivendo mal, e isso na maioria das vezes é a mais pura verdade. Tomei meu banho e passei meu hidratante e tomei cinquenta litros de água gelada antes de deitar na cama que estava uma verdadeira chapa de sanduíche de tão quente, aquele edredom rosa tentando fazer com que eu me afundasse, mas tava calor, tava muito calor, eu não aguentei nem com aquele ventilador ventilando aquele vento quente na minha cara, me sufocando e me dando dor de cabeça e desespero, eu só queria dormir em paz e não deu pra não levantar e e não pensar morta quase chorando de raiva do calor que deixa os paulistas acordados de madrugada quando estão mortos e com a ressaca começando a pegar, que bosta, que bosta de cama é essa, mil vezes a caminha dele que ficou lá do outro lado da cidade cheia de espaço vazio e janela enorme bem em cima, com um puta cara deitado nela sem nem saber que é um puta cara e que tem alguém derretendo num ponto do planeta chorando de sono e mesmo assim querendo ele. Essa casa está cada vez pior de morar, falta janela, falta espaço pros meus quadros, falta parede, falta ar condicionado, falta tv a cabo, falta porta que fecha direito, falta internet pra eu desabafar aqui no blog, falta estante pros meus livros que não cabem mais na estante velha, fico aqui com esses parentes andando pra cima e pra baixo fazendo barulho. Falta seu peso do lado me acordando de madrugada com um braço ou uma perna ou um braço e uma perna por puro instinto de ficar abraçado, falta teu narizinho respirando no meu pescoço e fazendo meu cabelo ficar subindo, descendo, subindo, descendo, falta tuas costas brancas cheia das minhas unhas compridas, falta teu corpo branco inteiro, teu pescoço branco, teus braços brancos todos pintadinhos em colorido, tuas pernas brancas e pezinhos brancos e a tua cueca preta e tua mão dentro da minha blusa pra eu dormir, como que pra ter certeza que eu não sou nunca mais de ninguém, que fudeu, agora eu sou tua pra sempre. Queira você ou não, agora fodeu, fim.
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