sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Um pequeno tremor que virou abismo e eu caí bem no meio.

Ainda que seja cedo, existe um cansaço. Ele entra pelas janelas junto com o ar abafado de 32 graus em plenas dez da noite de São Paulo. O calor bate nas paredes e rebate em mim e ficamos assim. Eu e o ar não nos suportamos. Todo o dia foi assim. Coloquei chinelos e desisti. Quase morri no calor dentro do quarto sem cortina. Então saí cedo e terminei com o namorado que não era mais namorado. Ele tenta me beijar, eu viro o rosto. Hoje não, respondo. Por que? Peço um suco de laranja pra ganhar tempo e conto porque. Cerveja no calor me deixa imprestável. Contei tudo. Ele disse que eu estava apaixonada por outra pessoa. Aí olhou meus pés e estranhou eu vestir chinelos mas não falou nada. Eu não queria contar pra ele que não existia luta a ser ganha. Pensei onde será que ele – o outro – ta agora, como é que eu vou passar esse tempo todo pensando nisso. Voltei a chorar enquanto eu escrevo, eu disse pro amigo um dia. Escrever sobre mim mesma é a dor mais desnecessária pela qual eu me obrigo a passar. No fim ele me abraçou e eu disse não some por que você é legal. Ele deu uns tapinhas nas minhas costas por não saber mais que gesto fazer diante do nosso castelo desmanchado. Fui embora arrastando meus chinelos pressionando forte com os dedos pra eles não saírem voando. Troquei de roupa de novo ao chegar em casa, lavei de novo o cabelo mas dessa vez não entrei no chuveiro, taquei a cabeça na torneira da pia da área de serviço. Lembrei dos banhos de mangueira na casa da tia malvada que hoje está morrendo sozinha. Minha casa é sempre o melhor lugar pra estar. Peguei a mãe de carro e levei pra Augusta comer pizza portuguesa e tomar cerveja, contei pra ela que agora eu sou mais uma solteira na cidade. Expliquei pra ela do Espaço Unibanco, da mostra de cinema anunciada no cartaz do conjunto nacional, do cosmopolitan que vendiam a preço de banana no bar ali na frente e do Arnaldo que vai autografar os dvds e eu quero ver. Tocou Zé Ramalho no carro na volta. O Zé tem dessas de aparecer nos rádios, violões dos outros, vitrolas de bar, sempre quando eu estou querendo me matar. Ao voltar, anoto no post-it: comprar um ventilador e uma luminária. Mato uma borboletinha com inseticida por que ela entrou no meu quarto. Sinto uma falta que mata. De alguma coisa, alguém, uma janela, um vento gelado. Estaca zero. E a voz dele sempre comigo, dizendo desfaz o bico, Karinamovich, desfaz o bico.
Escrevo nesse computador sem internet, sem tela plana, sem botão de rolagem no mouse. Escrevo sobre mim por que não consigo escrever mais de ninguém. Escrevo no escuro pro olho doer e eu não amanhecer o dia digitando. Minha cadeira não gira. Escrever aqui dá dor de cabeça, culpa, insônia e dor nas costas. Então não reclamem nem encham minha caixa de emails de reclamações de todo tipo – por que eu não blogo mais, por que eu escrevo asneira, por que eu tenho que escrever com prazos, por que você gosta de ler blog mas eu nunca atualizo ou por que você se incomoda com a minha vida. Parem, parem, parem. Teve um tempo que eu escrevia pra ele. Ele foi lá e escreveu um blog cheio de capítulos que eu li bem pouco pelo mesmo motivo que escrevo tão pouco aqui. Li pouco por que odiei. Recuso os convites dos amigos que querem que eu participe de todo tipo de mesa redonda, sobre os blogs, os livros, os livros virtuais, a internet, o twitter (que eu nem tenho), o my space (que eu nem tenho também), o caralho a quatro. Recuso por que já deu. O que eu escrevo e gosto eu não publico aqui. O que eu escrevi e gostei eu dei pra ele ler e me ajudar a ver o que é que a gente faz. Se não der em nada já serviu por ele ter lido umas coisas em voz alta (do jeito totalmente errado) que eu escrevi pra eu mesma escutar e por eu ter tomado da mão dele e gritado, dá aqui que eu vou mostrar como é que faz e ter lido pior ainda. Já valeu por ele ter entendido o negócio dos gatos e o negocio das baratas. Mas esse blog é meu e aqui eu escrevo o que eu quiser ou não escrevo nada se eu não quiser também. Quero me preocupar mais em sair vivendo que contando, como tem sido desde a morte do Meias Três Quartos, que contava menos que o Como Marretar Batráquios, que contava menos que o Donna Kuka, nos primórdios da minha inclusão ao mundo cibernético.
O que quero dizer com tudo isso é que eu escrevo porque eu gosto. Você que lê deve ter seus motivos que eu prefiro não saber quais são. Tudo vai continuar assim até eu descolar um novo layout e uma linha reta na vida. Não gostou vai ver televisão. Por aqui eu continuo.
Eu estava usando os brincos que ele me deu de presente. Não era um dia bom: no anterior eu já havia dito coisas demais e tudo que pude entender no final daquilo foi que nós nunca nos entenderíamos.  Sim, meu amigo. Karma é foda mesmo: se você que não acredita nisso então você não sabe nada.

As coisas se vão com a chuva


Assim podemos voltar a vida de sempre. Os cinzeiros ainda estão cheios, as garrafas ainda estão quebradas na calçada, a goteira ainda encharca o chão de madeira.
Eu achei que sofreria mais quando você se fosse. Mas não chegou nem a ser dor, era só uma coisa que estava presente.
É a primeira vez que escrevo depois de muitos meses. Eu sabia que ia ser pra você. Sabia que seria numa noite insone e com chuva. Parei de escrever por que fiquei vendo filmes demais, inclusive aquele sobre cinema que você disse. Na verdade, não era sobre cinema, e você sabia, não sabia? Era sobre o isolamento sufocando as pessoas.
Por isso eu voltei pra escrever pra você.
A vida é vazia, né, Mário?
Eu acho que é esse o ponto de referência.
Eu tentei explicar e você não entendeu nada, nem a gravidade, nem a sinceridade, nem a frustração, não entendeu nada.
Você não conseguia dormir também, lembra? Eu acho que ninguém entende essa coisa da gente só virar pro lado e dormir. Até eu demorei pra entender.
Mas não há nada para ser feito, apenas desistir. Descobri que a gente só desiste das pessoas quando elas desistem delas mesmas. Eu é que ficava pensando em como o mundo estava se virando sem a gente andando nele.
Você viu? O mundo se virou muito bem.
A vida sempre segue.
De uma forma ou de outra, eu me lembro de você.
Você se lembra de mim?
Me fala logo, Mário. Do que é que você lembra?
Preciso parar com isso. Escritores malditos filando meu cigarro, teatrinhos com cerveja e cama abandonada 72 horas seguidas por insistência da proprietária que acha que é de ferro mas está começando a ficar velha. Viajei numas de levar ela comigo mas ela me traiu e fez merda o tempo inteiro: saí para não mata-la. Então ela se levantou chorando e chorando ela foi embora. Dormi na cama dele de novo, mas no canto, e por duas noites seguidas eu juro que não abri os olhos nem uma vez sequer pra ver ele dormindo ou ajeitar o cobertor. E eu olhava a boca e olhava tão pertinho e pensava puta merda, olha os botões da camisa dele aqui na minha mão e ele olhando pra minha mão nos botões dele e depois pra mim, e pra minha mão já no botão de baixo e de novo pra mim e disse umas coisas que eu escutava e pensava não cai não cai não cai, pelo amor de deus não cai na conversa dele, por que tava na cara que era mentira e nada é perfeito e ainda tinha outra coisa: o quanto eu podia ser má e fria e jogadora (sim, vocês já leram isso) mas dessa vez diferente:
Eu não quero mais nada disso. Preciso parar com a bebida.

Algumas vezes ele retomou o caminho e se deparou com as luzes apagadas. Ela estava lá dentro com seus olhos perdidos e querendo olhar pela janela. Decifrar qual daqueles carros. Ela escreve para ele.
Ela escreveu Amor vira Carvão e decidiu que chega: No amor é necessário alguém para afundar junto.
Mudou de cigarro. Tomou porres mais sujos. Aposentou os saltos.
Não é possível voltar. Fez outras coisas, trabalhou em dobro.
Apaixonou-se de novo, tentou. O amor só acabava com ela.
Fugiu tanto que acabou cansada e tendo que pensar nele. Ele dentro dos carros debaixo dos postes de luz apagados. Pernas que ele nunca poderia gostar como gostava das pernas dela.
Palavras não adiantavam.
Era preciso o olho no olho.
Testa na testa.
É preciso ser forte.
Desobedecer os signos.
Então ela pulou.
Estava sem dormir.
Mulher apaixonada que não dorme é uma merda.

Monalisa

Olha lá, a Monalisa de novo. Detesto esse olhar debochado dela e odeio aquela parede. A Michele acha que ela compactua. Eu só acho que ela debocha. Ela, a Monalisa, viu aquele dia que eu estraguei com a noite do Márcio. Ela viu quando eu me rastejei até a cozinha pra comer um pouquinho de sal. Ela viu que eu não lembrei como era aquela música da Imelda pra poder explicar pro Flavio que ele tava tocando errado. Ela olhou pro homem que eu amo brochar, ela julga os amigos que eu tenho. E quando a vêem, ela até descola uns elogios, essa maldita. Aí olha pra mim de novo e dá o mais malvado dos sorrisos. Você se pergunta então por que você não tira essa desaforada e taca dentro do armário ou estilhaça ela na parede até virar um monte de madeira? Por que a Monalisa tem dona. A Michele colocou ela lá por que ela gosta muito dela. Eu disse vamos colocar uns quadrinhos coloridos, mas não. A Monalisa ia ficar onde? Eu não desisti, falei então por que a gente não coloca ela no corredor, no corredor fica melhor, mas não, de novo. A Monalisa tinha gostado da parede da sala e resolveu que iria ficar lá pra sempre. Olhando pra mim. Olhando pra mim e pra tudo que eu faço. Metendo o bedelho nas minhas coisas.
Ela não sabe que eu estou escrevendo sobre ela agora. Ela ta tentando espiar a tela do meu computador, mas ela não consegue. A Monalisa está séria. Se ela pudesse descruzar os braços ela me mataria com um porrete. Mas ela não pode. Ela não pode fazer nada.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

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Estou partida em duas
Uma te odeia
Outra não te esquece
mesmo que queira
muito muito muito
E agora o que eu faço
quando eu pego na mão essas folhas
em que você dizia
demore o tempo que for
e a culpa foi minha
e etc etc etc
Me diz
logo
o que
eu
faço?
?

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A gente não duvidava.

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Ela disse que ia sair com a gente pra conferência por que precisava sair daquela bad que tinha entrado - ou sido jogada mesmo - e não conseguia sair sem sua há muito oculta auto estima. Aí ela olhou logo pro cara que todos nós estávamos tentando fazer um contato há anos e por sinal tantos anos que todos já havíamos desistido e até pego raiva dele por que ele era o escritor maior arrogante do Brasil.
Clarinha, se comporta, aquele cara ali é o dono da A., meu emprego depende dele, o seu emprego depende dele, e o emprego do Mário depende dele, então sossega aí nessa cadeira, não pesa. E ainda por cima, parece que o cara nunca aperta a mão de ninguém.
Foi o que nosso amigo Paulo disse pra ela, quando notou as más intenções da garota.
Então ela disse “aposta quanto que eu vou lá, converso com ele por dez minutos, e ao me despedir, ele me dá um beijo?”.
“a bebida mais cara do bar como ele não lhe dará nem um minuto para começar”.
Todas nós nos olhamos e concordamos que o Paulo estava ferrado.
Clarinha levantou, e de alguma maneira se enfiou na roda do dono da A., falou durante exatos dez minutos, e ao despedir-se, foi cumprimentada com um caloroso beijo do dono arrogante da A. e voltou encarando o Paulinho jogando os quadris de um lado para o outro.
Sentou com seu ar triunfal, elegeu a bebida mais cara, e disse: “Agora vamos brindar a mim”.
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Ela disse meu nome é Sarah e eu pensei que puta nome clichê, mas ela estava balançando o rabo de cavalo pra mim e me embebedando descaradamente e falando sobre musica, trabalho, e sobre gérberas e sobre as coisas que podiam acontecer do nada, eu a ouvi o tempo todo. Quando eu brincava com ela a boca dela se desenhava em sorrisos escandalosos. De repente faze-la rir era meu oficio, e eu não entendia se ela gostava de mim ou estava bêbada ou se estava me achando um idiota. Ela me dava beliscõeszinhos doloridos com suas unhas afiadas e eu estava cheio de arranhões.
Ela ficou ali com os outros copos de uísque, ela e o rabo de cavalo, e eu segui cantando “ New or Old City Blues“ tentando sair de dentro da garganta dela.
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Eu estou cansada de saber

 
Amor é isso: é respeitar e acreditar e querer que a pessoa fique feliz contando que ela não fique feliz te colocando pra baixo. É querer que o resto se foda. Mas ele não ficava até o fim e queria que eu ficasse até o fim, e eu não sei ficar até o fim sozinha. Ele achava que podia ficar até o fim só quando ele resolvesse. E enquanto ele não se decidia resolveu me colocar pra baixo pra matar o tempo. Inventou até um carinha pra me perseguir nos e-mails. Porra, cara. Isso é difícil de aguentar.


Veja que pra ser feliz, a gente pode ficar bêbado perdido num canto e rindo com alguém que a gente gosta. O resto é só o resto. Ou você acha que já me viu na merda? Não viu não. Eu quase fiquei na merda quando você foi embora. Mas te toquei fora, queria que você sumisse, me esquecesse e se fodesse mesmo, eu pensei vai se foder, vai se foder, porra. Não foi, pois no meio do caminho tinha uma bunda, tinha uma bunda no meio do caminho.

Coitada. Sei lá de onde ela vem, a bunda de outrora e áureos tempos. Se é que me entende.

Mas vamos às vacas frias: O que eu fico doida da minha vida foi você assinar com o nome que EU te dei pra escrever textinhos de caubói metido a besta e bom comedor e se vangloriar com fodas louras e cabeludas e será que você é mesmo tão apaixonado por si mesmo assim?

Dicas da mamã:

1) Crie um nome seu.

2) Mude seu layout. Ou pelo menos disfarce. Coloque a foto num lugar diferente, a frase num lugar diferente, no blogger é bem fácil mudar o lugar das coisas. Mas de preferência, escolha um layout de sua preferência e não de minha preferência para escrever seus textos de Alabama.

3) Você não é escritor pseudo beat. Pare de escrever isso. Não força.

4) Essa coisa de seguidores é brega pra caralho. Tenha vergonha alheia. Não aceite essa góticas analfabetas só por que elas fazem número.

5) Pare de meter o pau em mim que eu sou obrigada a vir aqui e responder por que eu não fico quieta.

6) Essas fotos enormes e esses vídeos pesados acabam com a paciência das mais potentes internets pagas e speeds, e muitas fotos não tem nada a ver com o contexto – e nem com as musicas.

7) Se quiser falar de como deve estar a minha vida, leia meu blogue direitinho ou fuce no meu facebook que facebooks e blogues são pra essas coisas, mas não me subestime e nem encrenque com as suas suposições: Meus amigos continuam crescendo e firmes e incríveis (meus amigos sim, eu sei escolher muito bem). Meu trabalho não atrapalha minha vida e nem minha felicidade e nem minhas intenções por que eu estou gostando do que eu faço demais. Meus flertes vão bem obrigada, mas sei que a vida não é feita apenas disso.

8) Leia Kerouac direitinho e não se beneficie. Preste atenção que assim você não precisa comprar o livro só pra ler o trecho (para entender o que mamã quer dizer):

Não a dor que me impele a escrever isto mesmo sem eu querer, a dor que não será apagada pelo ato de escrever e sim acentuada, mas que será redimida, e se ao menos fosse uma dor digna que pudesse ser colocada em outro lugar que não essa sarjeta negra de vergonha e perda e loucura barulhenta na noite e pobre suor na minha testa”.

O coração dela batendo na chuva de São Francisco, na cerca, enfrentando fatos finais, pronta para sair correndo agora e voltar e acocorar-se de novo onde ela estava onde tudo estava – consolando-se com a visão da verdade”.

E em casa eu andava de um lado para outro, não conseguia parar, tinha que andar, como se alguém estivesse prestes a morrer, como se eu estivesse sentindo o cheiro das flores da morte no ar, e fui para o pátio de manobras da estrada de ferro em South San Francisco e chorei”.
Na dúvida - qualquer dúvida - ou vontade de me xingar ou me bater ou me chamar de louca ou se quiser saber da minha vida, venha cá. Sou boa em lidar com desaforos testa a testa. Dores passam - o tempo serve pra isso.
Além do mais, você teve sorte - lembre disso. Se quiser ser um personagem, seja um personagem seu, e não um que eu criei - você acabou com ele - ele não era assim.
No mais, é isso.
Página virada. Mas eu ainda lembro.
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terça-feira, 4 de agosto de 2009

Uma carta para Mariana

- Escreve uma coisa pra mim.
Pensei mas caralho, se eu escrever alguma coisa pra essa mina ela não vai entender nada, quem me entende já não entende o que eu escrevo, quem dirá, quem dirá... Pior é se ela entender, aí vou querer casar com ela só por que ela entendeu, aí é foda. Mas isso tudo no caso de saber o que escrever - quero dizer, ter inspiração pra escrever sobre a Mariana. Por que às vezes eu acho que a mina tem que me deixar muito maluco ou muito puto pra eu me dar ao trabalho de escrever sobre (nunca para)  ela. E eu acho que eu sinto por ela uma coisa meio mole, não é nada assim muito poético. E ela é uma mina bacana, merece que um dia alguém escreva um belo livro inteiro pra ela, mas um cara assim mais diferente de mim, eu acho. Mariana/ meu amor por ti / é uma pagina em branco. Vou te escrever um haikai. E se eu achar que ficou bom, eu te escrevo um poema, um poema inteiro, Mariana! Olha que bacana. Bacana, Mariana, bacana, bacana, cabana. Vai que ela gosta de rima. Ou vou copiar uma letra de musica de alguém assim que ela nunca vai ouvir na vida, super lado b, e ela nunca vai saber que não fui eu que escrevi e vai ficar feliz até morrer. Vai me dar um beijo com os olhinhos cheios de lágrimas e dizer que eu sou o poeta dela. Aí vai dar pra mim e a gente vai dormir. De manhã eu acordo, e recito a musica pra ela. Ela vai bater palminhas que nem criança e sorrir que nem um anjo. Eu vou achar graça e vou leva-la pra comer na padoca. Tem coisa melhor, Mariana? Dormir enroscado e tomar uma coca de manhã da padaria? Coca, padoca, paçoca. Esse negócio de rima eu acho que ela não vai gostar não. Pode ser que eu mande um inglês ou um francês - ai, que língua você merece, Mariana? Vou inventar uma língua nova e vou escrever um poema pra você nela, aí você vai ficar feliz em dobro por que eu vou ter inventado uma língua nova só pra te dizer alguma coisa. Mariana, Mariana, que maldita hora inventaste de me pedir um poema. Tão mais fácil seria colher uma flor. Uma flor que combine contigo, tem um monte. Agora poema, não tem. Mariana, desculpe, mas se esse meu esforço não valer, eu desisto.  
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Enquanto fingia dormir
Escutei seus dedos
Entrelaçando seus cabelos
Seu suspiro de cansaço
E o seu virar
Para o outro lado.
Jogando bosta no ventilador
ou
Apertando o foda-se (and be happy)

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Tarde, bilhar. Noite, Estúdio Sp. Madrugada, Tropicália no Saraievo. Manhã, Beleza Americana no Habib’s. Suco de maracujá, cerveja, caipirinha e adicionais.
Precisei tomar nota do telefone dele. Acho que eu decorei. Não decorei tudo, mas os quatro primeiros eu decorei. Tentei ligar e não deu certo por que não era Claro.

Queria dizer.
Vai cuidar de você.
Vai cuidar dela.
Eu não preciso ser cuidada.

Mas o que mais me irritou, foi ela me dizendo que tinha a solução pros meus problemas. Ela disse você é uma menina tão bonita, gosta de poesia. Você escreve umas coisas.
Pronto.

Tantas vezes por dia eu fico querendo dizer
EU NÃO LIGO PRA CINEMA.
Eu não sei nome de ator nenhum que ganhou o Oscar
por que eu não acho importante saber.
Por favor.
Me deixa em paz.

Então ele disse que gosta de meninas simples.
Basicamente, disse que não gostava de mim. Ela perguntou por que queria que eu escutasse. Sabe lá o que ela achou que ele ia responder. Eu acho que não foi por mal. Ela só acha que eu devia botar a cara e gostar de cinema, de repente. Eu fiquei brava por que eu ando brava com tudo mesmo. Não foi com ela. Eu gosto dela.

Ele não gosta de meninas complicadas. Ele gosta de gente simples, humilde. Bonito. Eu acho.

Tocou aquela música dos Raimundos.
Mas o tempo passou, eu agora sou mais velha e o Rodolfo virou crente, então.

Ah. Olha aí, eu sei o nome do vocalista dos Raimundos. Não tem que saber os nomes dos artistas? Viu? Eu não ligo pra cinema mas eu sei de “rock farofa brasileiro contemporâneo”. Como diria o Pier, super prafrentex.

Mas eu tava falando do tipo de mina que ele gosta. Desculpem a mania de me perder.
Ele disse que gosta de menina
que não fala que vai mijar,
que nem eu falo.
Ele acha que a menina tem que falar
que vai fazer xixi.
Que nem ela fala. Óquêi.
Ah, ela não fala xixi. Ela fala “CICI”. Bonito.

Ela é uma moça muito educada.
Ela tem essa fofura rosada nas bochechas.
Ela é um partidão.

Mas cá entre nós:
Quem fala “mijar” põe o dedo aqui.

 
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Quando a noite tem cara de bebida barata de boteco

 
Sei lá o que ele ficava reclamando que era foda, mas eu não queria saber. Foda, é não tomar o copo até a última gota, e foda é não ficar bêbado. Foda é ser castrado, humilhado, foda é botarem tua lealdade em dúvida. Foda, meu caro, é não foder com a pessoa que você ama, foda é não ter um real pra comprar cigarro do Paraguai. Foda é ninguém te escutar quando você tá falando, foda é ver TV sozinho e falar sozinho na cozinha. Foda é você querer dar um abraço em alguém que tá ali na tua frente e ver que não consegue. Foda é ter que desistir das coisas.
É mesmo muito foda não ser a pessoa certa.
Você não sabe porra nenhuma de nada, cara. Você não sabe porra nenhuma de mim. Eu acho que você devia parar de bancar o Dom Juan barato da casa do caralho.
Pouca coisa me toca nessa vida. Palavras geralmente não estão na lista. Passar bem. Ah, e antes que comece a história derrotada, eu não odeio você. Eu gosto de você. Gosto tanto que estou te mandando a puta que te pariu.

Sem ressentimentos.
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terça-feira, 30 de junho de 2009

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Você passou por mim e eu quis te matar, dar um escândalo, mastigar flores, me bater no nariz, te morder no pescoço. Mas você não reparou. Você nunca repara em nada.
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Coisas que vem com a chuva.

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Lembrei da cidade de madrugada e como parecia tanto São Paulo, aquele frio, as horas arrastando e eu ali batendo meus dentes e cheia de uns poemas na cabeça que se perderam por que eu não podia escrever ali, não na frente daquelas pessoas e daqueles olhos. Por deus. Jurei que era passado. E tudo isso eu reparei quando liguei pra ele, ele que cantava pra mim. Ele cantava pra mim e furava minha alma com aqueles olhos dele, que olhos mais perigosos, assim como eram perigosas as mãos e a língua entre as coxas. Eu disse pra ele, que problema enorme, que problema enorme que a gente foi arranjar. Até hoje eu não sei se ele entendeu que eu gostava dele. Eu gostava dele. Eu gostava daquele cabelo grisalho e macio entre os dedos e da língua dele na minha boca. Ele tinha um cheiro doce. E eu continuei sem ter o que falar pra ele, não sei nem por que eu liguei, eu simplesmente acordei e liguei. E ele demorou pra atender. Quando ele demorava pra atender antes, eu desligava. Hoje eu esperei. Aí ele disse alô com aquela voz dele. Aquela voz dele. E ele disse que estava com saudades e feliz por eu ter ligado, que tinha passado uma semana. Eu pensei nele durante essa semana, mas eu tive problemas. Eu quase morri essa semana. Não contei pra ele. Disse que era culpa do telefone, que eu estou sem. Ele disse pra ligar de novo. Vou ligar. Estou com saudade. Daqueles olhos cinzas que ele tem. E daquele olhar duro.
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Se alguém me ver bebendo perto dele, por favor, tirem o copo da minha mão. E se já for tarde e eu já tiver bebido tudo e estiver lá tentando pegar nele, peguem o copo vazio e quebrem na minha cabeça. Agradeço.
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Bill Joke

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Permito agora que ele me venha fazer companhia, quando sozinha me encontro e ele está num canto ali do verso. Não machuca mais. Não sei se é boa lembrança ou ruim. É apenas uma lembrança que ás vezes vem e parece nítido por que não poderia ter um fim melhor. Os finais são sempre os finais.
E eu sempre deixarei esses homens me estenderem o copo sem entender que é apenas um copo. Eu pensei que ia morrer com um buraco, mesmo que ficasse tentando tacar areia, mas areia é apenas areia. As coisas são apenas o que são. Tudo é muito simples, ele não me amava e achava que sim. Ele achava que sabia o que era amor e não sabia. Eu pensei que ele sabia também. Cheguei a escutar uns eu te amos e mergulhar na comoção. Cheguei a dar vexames, escândalos e a escrever umas coisas. Nada melhor pra literatura do que aquilo que não aconteceu. Tudo era um poderia ser. Tudo era tão abstrato. Imagens na cabeça nada tem a ver com amor. Devo ter fumado mil cigarros pra sua memória. Punha-me a pensar em você e engolia uma bebida qualquer, ao som de qualquer musica.
Tudo era um jogo fácil de se passar por cima. Cantar na chuva e virar as costas e dizer umas coisas e desaparecer. Até quando você me perfuraria com as suas agulhas se eu não dissesse nada? Até quando ia ser de verdade se eu não questionasse?
Eu hoje reapareço. Já não me sinto presa às tuas linhas e já não me sinto culpada por nada. Eu fiz o melhor que pude. O que não valeu nada em vista do que eu ganhei de volta, quando eu nem queria ganhar nada de volta. Só aquela coisa que você achou que sabia sentir. Que eu achei que podia entender.

Você não sabia era do lado negro. Achou que eu não tinha rugas só por que você não as via? Achou que eu não tinha um monte de pesadelos só por que eu não acordava? Achou que eu era viciada em bebida? Que ia morrer de tanto tomar droga? Aqui estou eu, Bill Edwars, velha e bêbada, olhando pra você e você não está me olhando de volta. Aqui estou eu, meus cabelos brancos, olheiras, doenças e rugas. Aqui estou eu, meus manuscritos que não viraram biografia, minhas tintas no chão e meus batons vermelhos. Ali está meu espelho quebrado e ele me olha de volta exatamente como eu olho pra ele, entendendo todos os meus atos e me acompanhando o melhor que pode. Minhas linhas eram apenas tuas, nunca foram divididas com mais ninguém. E era perfeito esse homem que bebia comigo e tocava piano, tocava jazz e blues e rock, o mesmo que hoje que sobrou nas linhas e nem assim, nem mesmo assim Bill Edwards, o senhor soube guardar para mim algo que seria só meu e de mais ninguém.
Eu sou esta mulher acabada e enrolada numa coberta tentando não morder a língua no frio, escutando os chocalhos do próprio rabo e tirando o pó dos livros. Eu sou esse vaso quebrado e colado com cola pritt, essa porcaria remendada que não enfeita mais nada.
Para Bill Edwards tudo continua fácil. Sua Kate entrou num labirinto onde todas as saídas dão em nunca mais.